De um tempo para cá, o Facebook
passou a mostrar publicações passadas, de um ano, dois atrás e é engraçado,
porque estas publicações mais antigas trazem os mais diversos tipos de sentimentos
e emoções, da vergonha à mais pura saudade. Sinto, desde a vontade de
simplesmente ignorar, olhar para cima e agradecer pelas mudanças que o tempo
trouxe consigo, à vontade de voltar naquele dia específico e reviver situações
bastante específicas, minutos, até mesmo aqueles segundos de duração de um
sorriso ou de um abraço.
É engraçado como o tempo passa
sem que possamos perceber. Sempre que topamos em alguma lembrança, percebemos a
velocidade dele, percebemos o quão efêmeras são as situações, as relações,
aqueles instantes preciosos que passam e deixam pequenas (grandes) marcas no
coração. Fica tão claro o amadurecimento, que chega a assustar.
Me peguei pensando: daqui a um
ano, quando o Facebook me mostrar as lembranças do dia de hoje, será que
sentirei saudade, vontade de voltar (como senti hoje), ou será que darei graças
a Deus pelo passar do tempo?
Pensando aqui com meus botões,
não sei até que ponto foi bom ter aprendido a lição de viver intensamente o hoje,
me entregar ao momento, ao presente, aos instantes preciosos que ficam
cristalizados no coração. Aprendi, mas não sei lidar. Sou péssima em lidar com
meus próprios sentimentos, o que é absurdamente contraditório, já que os
sentimentos dos outros aparecem para mim como uma planilha do Excel, totalmente
claros e organizados. Também não sei lidar com o produto de ter aprendido a
viver somente a minha idade e tudo o que vem com ela. Sei sentir, mas não sei o
que fazer com o sentir, em si. Mas aí, lembro do meu querido Kant, dizendo que
a gente nunca vai conhecer a essência das coisas em si, uma vez que não conseguimos
dominar nossos instintos (que nos permitiria este acesso à essência das coisas
em si, à verdade) e que meus sentimentos são exatamente o produto desta falta
de controle dos instintos, que acaba me cegando.
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Ainda atropelo as coisas, me
perco entre sentimentos e razão, mas consigo me enxergar um pouco mais racional,
por incrível que pareça, e sempre
critiquei quem permitiu que o tempo criasse esta espécie de “casca” no coração
e cá estou eu, usufruindo da proteção das primeiras camadas dela, me permitindo
ficar imersa, protegida, no escuro e no silêncio que esta casca traz, nessa
espécie de “útero” que a vida vai criando aos poucos e que tendemos a
permanecer deitadas, encolhidinhas, aconchegadas entre lembranças doces e vergonhas,
entre sonhos e cutucões da realidade, entre conquistas e frustrações.
Cada vez menos pessoas passam a
cruzar essas cascas, o silêncio e a reflexão vão aumentando, a tolerância à dor
tende a aumentar, o silêncio e a solidão passam a ser os melhores analgésicos,
o travesseiro se torna o maior e melhor confidente e o sorriso no rosto no dia
seguinte passa a ser presença obrigatória – dá uma preguiça imensa de dividir
com as pessoas o que se passa aqui dentro, ficar “esticando chiclete”,
revivendo e cutucando aquilo que machuca e incomoda.
Por ora, ainda desejo ter alguém
que esteja sempre dentro dessas cascas, de mãos dadas comigo e de peito
igualmente aberto, mas sinto, cada vez mais, a cada frustração, as cascas
engrossando e diminuindo a possibilidade de que alguém, além das duas ou três
pessoas que entram e saem quando querem, poder entrar e sair daqui.
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