“É
fevereiro (fevereiro!), tem carnaval (tem carnaval!)”
Primeiro, te fiz crer que Deus
havia lembrado de ti ao me colocar em teu caminho. Fui frio na barriga, noites
em claro trocando mensagens, o sorriso bobo diante da mensagem às 5 da manhã, o
flerte gostoso, que foi, aos poucos, mostrando as coisas boas, tanto daí,
quanto de cá. Fui a sakura florida na saída do metrô Liberdade, que confere
cor, leveza e encanto aos corações apressados e aos passos rápidos no concreto
da calçada, que muitas vezes massacram um broto de flor em alguma rachadura sem
sequer perceber.
“Tipo
passarinhos, soltos, a voar, dispostos a achar um ninho”
O outono chegou, o vento apertou
e algumas flores foram embora, deixando alguns galhos mais secos à mostra. Tudo
bem, afinal, sou humano e você já esperava tais partes não tão floridas,
coloridas e cheirosas e me senti à vontade para compartilhar algumas
insatisfações, alguns traumas, algumas partes desagradáveis; me senti à vontade
para pedir apoio quando o All Star machucou o calcanhar. Mas ainda havia aquele
encanto, de perceber que não há perfeição. O rosa das flores ainda sobrepunha o
marrom dos os galhos secos.
“Ele
também é humano”
Junto com o vento frio do
inverno, veio o céu nublado, a garoa e as flores foram todas embora. Os transeuntes
entram e saem do metrô, embaixo de seus guarda chuvas, esbarrando uns nos
outros, pisando em poças d’água e xingando por terem molhado seus sapatos. A sakura
perde seu brilho e passa a ser só mais um amontoado de galhos secos que ganham
destaque no contraste com o céu nublado. Algumas gotas de chuva fazem morada em
minha barba. A beleza escorre pelo meio fio e se perde na primeira boca de
lobo, levando algumas bitucas e restos de papeis de bala consigo.
“Não
quero problemas”
Isso não se referia somente a
relações problemáticas, mas a problemas cotidianos, àquelas casquinhas de
feridas antigas e ainda doloridas, aos arranhões do dia a dia, aos incômodos, a
qualquer coisa que pudesse caber na caixinha de ‘problemas’ – e os meus, óbvio,
sempre eram menores, não mereciam atenção, pois eu reclamava da angústia que
sinto quando tiro a barba e você sempre me lembrava das pessoas na hemodiálise.
Nunca vi tanta necessidade nem urgência em seguir à risca o indicado pelo
pronome “meu”, ao falar de ‘meus’ problemas. Sempre pensei que quando a gente
procura alguém para contar o que nos aflige, é porque confiamos e queremos nos
sentir acolhidos. Mas não com você, que faz sempre questão de me empurrar do
ninho e manda aquele “voa logo e não me incomoda piando, que tenho mais coisas
na vida a serem feitas”. Era primavera. O piado era de alegria por ter tantas
flores ao redor de si e compreender que mesmo aquelas flores que não eram tão
perfeitas, também tinham sua beleza e também tinham seu perfume.
“O
sol, céu azul e calor me fazem agradecer a vida”
Ahhhh, o verão... A areia fina
entre os dedos dos pés, o barulho do mar, o coração feliz, as diferentes
tonalidades de pele à mostra, a impressão de que tudo havia acalmado e a
resignação diante de adaptações, afinal, ninguém tem obrigação de me acolher e
me compreender; se estou mal – quem ESTOU? – é uma responsabilidade única e
exclusivamente MINHA; para que e por que procurar dividir com a pessoa que um
dia me disse que eu havia sido o motivo de seu sorriso bobo e que não me queria
somente quando eu estivesse bem, mesmo que desejasse que eu estivesse sempre
bem?
No verão, a gente sorri com o choro entalado, concorda com vontade de gritar o
quanto realmente discorda, agradece a vida mesmo sentindo vontade de mandar
Deus se foder. No verão, a gente bate o dedinho na quina do móvel de ébano e
sorri ao invés de xingar até a terceira geração do marceneiro. No verão, a
gente encarna a persona da Amélia, sorri e acena, pede perdão antes de errar,
muda a anatomia da garganta para poder caber o nó sem fazer chorar. No verão,
tudo é lindo; seja por estarmos apaixonados, lendo e ouvindo aquelas frases que
nos fazem sentir o homem mais especial do mundo, seja porque nos deixamos
cativar pela raposa no verão passado, seja por termos aprendido a amar nossa
rosa e todos os seus espinhos.