“Se eu não tenho o que quero, me
sinto só e triste. E se eu tenho o que eu quero, tenho certeza de que irei
perder. E a espera é insuportável” essa madrugada, assistindo Flores Raras e
pensando em tudo o que aconteceu na última semana, essa frase da Bishop me
descreveu perfeitamente. E eu ainda acrescentaria que acabo fazendo tudo o que
estiver ao meu alcance para antecipar a perda e findar a espera.
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Escolhi esse filme porque me
identifico com a sensação de não-pertencimento a alguém e/ou a algum lugar que
a Bishop tem. Essa coisa imensa, que é tão grande e tão vazia que não cabe
dentro de si e acaba escorregando para uma folha de papel, e, no caso dela, para
um copo com whisky. No meu, para comprimidos que me colocam para dormir e me levam
a uma temporária não-existência, que acalma a aflição de me sentir solta e
vazia, feito um daqueles balões de hélio, que têm aquela forma extravagante,
brilhante e chamativa, mas dentro de si, têm um vazio tão grande que chegam a
ser mais leves do que a gravidade e voam alto até explodirem e, definitivamente,
deixarem de existir e logo virem outros para o substituírem.
É um vazio tão meu e tão repleto
de monstros enjaulados e fortemente acorrentados a bolas de ferro, que me
faltam palavras para transpor a sensação à compreensão. É um esforço imenso
para manter todos devidamente enjaulados; às vezes, dá a impressão de que as
jaulas cederão e todos serão libertos, para me consumirem e me fazerem explodir
e simplesmente deixar de existir. Antes, me causavam uma dor profunda. Hoje, me
cansam profundamente, me levam à exaustão diante de gatilhos ínfimos, pois são
anos tentando mantê-los contidos e longe de mim de das pessoas pelas quais mais
sinto carinho. Ainda assim, vez ou outra, escapam e causam estragos extremamente
dolorosos. Me sinto impotente diante de mim mesma.
Sempre tento fazer vista-grossa
para esse esforço diário, mas há momentos em que simplesmente esmoreço diante
de mim mesma, derreto na frente do espelho e meu reflexo permanece impávido, me
observando do alto de seus 1,73m, balançando a cabeça em sinal de reprovação. Nesse
momento, sinto vontade de ser absorvida pelo chão, desaparecer e deixar apenas
que meu reflexo exista, pois ele é mais forte que eu; sobrevive dentro do
vidro, não pode ser tocado, pois o vidro o protege, não sofre nem sente nada. É
fruto da refração da minha forma externa, sem todo o tormento e cansaço
internos.
Já tentei e quis muito tirar
minha vida, mas a impressão que tenho é a de que continuarei vivendo nessa trincheira
mesmo depois de não ter mais domínio sobre meu corpo físico; é maior, vai além.
Sinto que continuarei sendo acompanhada por cada uma das jaulas pesadas, enferrujadas
e que porcamente detêm esses inquilinos indesejados que nasceram comigo e me acompanham.
Minha sensação, hoje, é de
cansaço. Mas não aquele cansaço que faz sentir vontade de desistir. Cansaço daqueles
de quando fazemos movimentos e esforços repetitivos, cansaço oriundo da
repetição e de se ter atingido o limite e ainda assim continuar sendo
insuficiente. Cansaço de saber que tenho apenas 24 anos e uma vida pela frente para
continuar correndo entre jaulas, verificando fechaduras, trocando grades e
correntes, afim de manter esses monstros detidos e contidos. Talvez, não seja “cansaço”
a palavra, mas sim uma imensa desilusão diante da impotência.
Vai ano, vem ano e sou sempre a
mesma pessoa suada e descabelada, a mesma carcereira incapaz de controlar os
detentos, por maior que seja o esforço. Trabalhando 24h, sem férias, sem
folga, sem descanso.
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