- Alícia!
Imagem: Avenida Paulista, São Paulo, SP, Ana Paula Costa. Tumblr
Ouvia o eco de sua própria voz buscando por Alícia naquele
mar de gente indo e vindo, falando ao celular, gesticulando, se misturando na
faixa de pedestres até que o semáforo ficasse novamente vermelho e uma fila de
carros levasse Alícia embora de vez de sua vida.
Abaixou a cabeça, olhou seus pés, suas mãos na altura do
quadril, seus braços largados ao longo do corpo. Respirou fundo e prendeu o ar
numa tentativa inútil de conter a dor. Fechou os olhos e lembrou daqueles dedos
finos e delicados escorregando de suas mãos para nunca mais tocá-la. Pôde
sentir o perfume daqueles fios dourados – quase brancos – sendo despenteados
pelo vento enquanto Alícia corria sem rumo.
Virou-se devagar e sentou-se no banco mais próximo. Com as
mãos repousadas sobre os joelhos, lembrou do dia em que se conheceram. A
primeira vez em que se deparou com o encanto daquele sorriso largo no rosto
adornado por sardas pequenas e harmoniosas, que contornavam os olhos pequeninos
e azulados. Lembrou-se da sensação “gelada” que tomou conta de seu peito
naqueles cinco segundos em que Alícia sorriu. Sentiu as lágrimas quentes e
pesadas caírem de seus olhos e serem absorvidas pelo algodão de sua calça
marrom.
- Ah, Alícia! – Sussurrou quando, de cabeça baixa, enfiou os
dedos entre os fios de cabelo até chegar com as mãos à nuca, onde cruzou os
dedos e ficou imóvel, apenas ouvindo o fluxo sanguíneo e sentindo seu coração
bombear o sangue cada vez mais rápido e com mais força.
Entrou no apartamento – ainda repleto de Alícia; seu perfume,
sua bagunça, a louça suja na pia, os chinelos desalinhados ao lado de sua
cadeira, o cinzeiro sem caber mais um átomo sequer – tirou os sapatos e
deparou-se com sua face desfigurada diante do espelho. Olhou-se de cima abaixo.
Pensou como seria sua vida sem Alícia dali em diante. Sentiu seu peito formigar
e arder.
Com os cabelos úmidos de suor e colados à testa, foi ao
banheiro. Abriu a torneira, ouviu a água correr por alguns instantes. Colocou o
rosto embaixo d’água até que ficasse sem ar. Fechou a torneira, levantou o
rosto e ouviu barulho de vidro se partindo. Quebrara o copo que Alícia havia
esquecido no banheiro, como fazia todos os dias. Viu sua mão esquerda cortada e
sangrando; não doía. Passou a mão no espelho à sua frente, como se borrasse sua
própria imagem. Não se reconhecia mais. Alícia havia levado consigo sua
identidade, seu coração, sua garra de viver.
- Rápido, moça! Tem um corpo aqui no canteiro! – Berrava o
porteiro – Não, são sei se é homem ou mulher, tem sangue pra tudo quanto é
lado, não consigo chegar perto!
Linda a história! Um amor tão profundo que não nos reconhecemos mais sem a pessoa que amamos! Sei como é essa dor desesperadora e esse medo de não conseguir viver sem o outro! Ficou uma história incrível!
ResponderExcluirObrigada, baby!! <3
ExcluirAlém de adorar a escrita, amei o trocadilho Ali se ia...Alicia! Você usa as palavras com maestria! Me emociona sempre!
ResponderExcluirObrigada!!!
ExcluirRealmente sem conhece-la ja a admiro palas belas palavras mais uma que nos deixa com nó na garganta.
ResponderExcluirObrigada, Ricardo! Fico feliz por saber que minha escrita te emociona! Venha sempre! rs
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