quarta-feira, 25 de maio de 2016

Crônicas do Cotidiano XV - Sobre confiança e pureza

Sabe aquele alguém com quem você sente segurança suficiente para atravessar um slackline de mãos dadas sem sentir o menor medo?
Aquela pessoa que já te viu nua – no sentido mais amplo da palavra – e não saiu correndo; consegue conviver com seus “outonos” sem se assustar com as feridas nos galhos, sem se amedrontar com seus monstros interiores nem com seus defeitos maiores e mais densos.
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Aquele ser que mesmo longe parece sentir o que se passa dentro do seu coração e quando se encontram, as palavras são totalmente desnecessárias, pois os corpos conversam entre si em perfeita sintonia; respirações descompassadas, cabeças desajustadas, anormalidades compatíveis, medos que entrelaçam as mãos.
Esse alguém é em quem você confiaria, permitiria ser tocada mesmo que toda sua pele fosse removida do corpo, deixando todas as terminações nervosas, veias e músculos expostos, pois você sabe que o toque da pessoa cura, acalma, acalenta, ajeita. Você sabe que é um toque doce, sincero; sem a menor lapidação, porém incapaz de ferir.
É aquele alguém que não saiu correndo quando você tirou a máscara que esconde sua escuridão; um alguém que entrou sem o menor medo, pelo contrário, abriu a porta da escuridão dela e também te mostrou os cantos mais empoeirados e complicados.
É a pessoa com quem você passaria todos os dias da sua vida, sabendo que a admiração, o amor, o respeito e a confiança só aumentariam a cada dia, porque foi esse ser que conheceu – e respeitou – todos os seus pontos fracos e defeitos e mesmo assim permaneceu e permanece ao seu lado, sempre com um sorriso largo e um olhar doce no rosto, sempre de braços abertos a oferecer um colo pintadinho e um abraço apertado.

É uma pessoa que te faz sentir gratidão simplesmente por poder ser exatamente quem você é e te faz sentir especial por ser merecedora de sentimentos tão brutos e puros!

sexta-feira, 20 de maio de 2016

Apenas fique e continue sorrindo sem mexer a boca...

            Olhar sereno. Mente inquieta.

            Expressão impassível.

            Coração barulhento. Toque sincero.

            Sorri sem mexer a boca.

            Me conhece além do que mostro.

Me invade.

Me vira, revira, bagunça, colore.

            Me morde. Arrepio.

            Me belisca. Sorrio.

            Me beija. Aquiesço.

            Me olha. Me rouba de mim.

            Me liga. Descompasso.

            Me abraça. Dissocio.


            Me possui. Assim.

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Insone

02:50. Silêncio. Ouço apenas o barulho da chuva nas telhas de zinco. Um barulho que não sabe se vai ou se fica.
Mais uma noite conforme o ritual: direita, esquerda, costas. Descubro o ombro e cubro a orelha. Descubro os pés e estico a perna. Milhares de pensamentos fazem uma verdadeira micareta em minha mente, a despeito do horário que – teoricamente – tenho que acordar. Finalmente desisto e pego o celular com a única finalidade de checar quantas horas de sono ainda me restam.
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Vejo as horas, faço as contas e vem a dúvida cruel: Durmo 4h e levanto ou fico sem dormir, mesmo?
Tento fechar os olhos e dormir. Vã tentativa...
Depois de cumprido o ritual de posições, cálculos de horas de sono e inúmeras tentativas de adormecer, me peguei refletindo a respeito da minha insônia.
Há uns anos, minhas insônias eram sempre densas, repletas de pensamentos profundos e obscuros, questionamentos absurdamente retóricos, angustiantes. Hoje, a única angústia que passa as madrugadas comigo é a de saber que tenho aula pela manhã, o que sempre foi uma verdadeira tortura, porque não importa quantas horas de sono eu tenha, antes das 10:00 sou um verdadeiro bichinho.

É muito boa a sensação de ter as rédeas da situação, saber que o problema de passar a noite em claro é exclusivamente meu.


segunda-feira, 16 de maio de 2016

Excreção

Te sinto correndo por minhas veias, como uma substância viscosa, pegajosa, nociva.
Sinto escorregar por meus tecidos, invadir minhas entranhas, confundir minhas sinapses, devorar meus pulmões.
Substância aderente, impede o funcionamento devido do meu organismo.
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Embaça minha visão, até escorrer por meus olhos em forma de lágrimas. Corrói meu estômago até sair de mim em vômito. Sufoca minha garganta, até que eu a expulse num grito.
É como heroína na seringa. A atração fatal da agulha pela veia saltando, pulsando, sendo perfurada. Você se mistura a mim, entra no meu sangue, percorre todo o meu corpo, me vicia, me torna tua escrava. Faz de mim o que bem entende, sem o menor pesar.
Pois hoje, ao descobrir que as minhas veias não são as únicas a serem perfuradas e invadidas por você, expilo-te de mim em forma de excremento, de resto, colocando-te em tua posição de inutilidade. Só sabe viciar, fazer mal, corroer, destruir, manipular.

Limite-se à tua seringa e nunca mais ouses perfurar minhas veias e me tomar novamente.