Ainda não
sei como consegui, de onde tirei forças para ir à aula hoje pela manhã. Foram
as 2h mais longas da minha vida até agora. As palavras da professora coavam num
vácuo dentro da minha cabeça, eram como ímãs colocados numa tela em branco
feita de pano envolta numa belíssima moldura do sono mais genuíno.
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A turma foi
liberada no intervalo. Quase ajoelhei para agradecer à professora mais
sorridente com quem já tive aula às 8h da madrugada. Sim, madrugada. Caminhei até o metrô conversando com duas amigas sobre
algo que não me lembro, minha única recordação é uma delas contando que tinha
medo de passar embaixo de árvores porque quando era pequena a mãe disse a ela
que caíam uns bichos, tipo umas lagartas, que entravam pelo umbigo e se
alojavam dentro das crianças. Confesso que mesmo com 22 anos fiquei levemente
aterrorizada com a ideia de ter uma lagarta invadindo meu umbigo e fazendo
morada dentro de mim. Já tenho tantos monstrinhos aqui...
Quanto mais
me aproximava de casa, mais me sentia tomada por aquela sensação de não ser
mais senhora de mim mesma. Só conseguia pensar na minha cama, meu travesseiro
macio, meu cobertor quentinho. Cheguei, despachei a bolsa e o fone em qualquer
canto da casa e me entreguei aos encantos da minha cama, me deixei seduzir
mesmo sabendo que teria de acordar em no máximo 1h porque tinha compromisso.
Pouco antes
de pegar no sono, totalmente tomada por aquela sensação indescritível de quando
estamos a poucos instantes de fecharmos a porta da carruagem que nos levará aos
braços de Morfeu, me peguei pensando sobre os prazeres da vida. Como boa
aquariana, lógico que meus pensamentos não cessaram. Em questão de minutos,
cheguei à conclusão de que todos, todos
os prazeres da vida são imateriais, são aqueles segundos ou minutos de clímax,
seja antes de dormir, depois da primeira garfada daquela comida maravilhosa,
durante a primeira tragada no cigarro após horas de abstinência. O prazer acontece
dentro de nós mesmos, é imediato e indescritível – ou alguém já conseguiu definir
com precisão universal o que é o prazer, aquele depois do cafezinho, do cochilo
ou do abraço, como conseguiram descrever o medo?
Quando
compramos uma roupa nova, por exemplo, o real
prazer não é comprar, não é vestir, não é exibir a nova aquisição. O real
prazer é a sensação, ou melhor, as sensações que temos ao vestirmos algo que
nos deixará mais bonitas, confiantes, especiais. O sorriso no rosto, a auto
aprovação, a autoconfiança. O prazer em comprar uma roupa nova é poder sair às
ruas sentindo-se segura, com a certeza de estar bonita para si mesma, mesmo
sabendo que todos temos gostos diferentes e que provavelmente alguém irá odiar
o novo look. Mesmo o prazer dos exibicionistas, creio que esteja atrelado a uma
imensa baixa-estima, superada momentaneamente enquanto atrai olhares e elogios,
atenção no geral, momentos em que
sentem-se especiais, confiantes, únicos, de bem consigo mesmos.
Creio que a
famosa frase feita “o prazer da vida está nas pequenas coisas” veio dessa
sensação ainda sem nome ou classificação, que dura apenas alguns instantes após
consumado o ato que satisfaz o desejo, aquele êxtase, como se estivéssemos no
topo da montanha-russa, prestes a despencarmos de sabe-se lá quantos metros,
termos a tão adorada adrenalina liberada, sentirmos o vento no rosto, a incerteza,
a dúvida “é medo ou prazer?” para depois chegarmos à conclusão “medo também é
prazer.”
O que quero
colocar, deixar para reflexão, é o seguinte: O prazer está atrelado ao poder?
É realmente preciso poder para sentir?
Partindo de que o poder é como
uma viga firme de madeira nobre, que garante estabilidade, e o prazer é uma
sensação efêmera, a linha que o separa do poder é realmente tão tênue assim, ou
é mais cômodo não enxergar o abismo que há entre prazer e poder, assim não se
faz necessário assumir que somos todos iguais e sentimos os mesmos prazeres
diante de necessidades básicas, mudando apenas a forma, os instrumentos utilizados para que seja
alcançado o prazer? Lembrando que quanto maior o poder, mais sofisticados e
caros, são os instrumentos, e consequentemente são tidos como melhores, sendo que nem sempre o mais
caro e sofisticado é, de fato, o melhor.
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