Alguns dias, sou barulhenta
demais. Outros, meu silêncio coloca em dúvida minha existência.
Não cumprimento vizinhos,
simplesmente abaixo a cabeça e os atravesso como se fossem seres etéreos. Vez
ou outra, sento na janela e sorrio para Deus, o mundo e mais um, distribuindo
flores a quem se dispuser a simplesmente me devolver um sorriso, mesmo que
apenas com o olhar.
Ha dias em que a casa está
colorida, cheirosa, limpa e aconchegante, pronta para acolher com amor e
carinho a todos que desejarem entrar, passar pela porta florida. Há outros em
que o cheiro de mofo e a escuridão embriagam até a mim.
Nem sempre cuido das rachaduras
nos muros do quintal. Em algumas manhãs, acordo desejando substituí-lo por uma
linda cerquinha branca que proteja meus girassois (proteger de quê, exatamente,
não sei. Vai ver, é aquele medo humano de ter sua “propriedade” saqueada, mesmo
que tal propriedade seja alugada, emprestada, cedida. O que tem lá é meu
e vou proteger, mesmo que seja com uma cerquinha branca e baixa, afinal, para
algo ter significado real, deve, primeiro, ter significação mental e é o
tamanho desta que, ao ser transposto à realidade, acalma a ansiedade diante da
possibilidade de ter os desejos contrariados, no caso, ter meus girassois
roubados por algum tolo apaixonado que deseje agradar a quem ama – o que, num
dia bom, seria totalmente perdoável).
Nunca pago em dia as parcelas do
aluguel. É como se o atraso fosse a regra. Nunca gostei de relógio, de tempo. O
tic-tac sempre me deixou exasperada. É como se o barulho do relógio fosse o som
da vida moendo meus sonhos lentamente... tic-tac... lá sei a vai a inocência...
tic-tac... adeus pessoas que amo... tic-tac... mais uma porta batida sem dó...
tic-tac, tic-tac, tic-tac! Tempo, para mim, nunca foi cronológico, sempre foi funcional.
Uma hora pode ter a duração de um ano, só depende do fato que ela antecede. Dez
anos podem passar num piscar de olhos e só nos darmos conta ao encontrarmos
aqueles fios grisalhos que não habitavam o couro cabeludo há tão pouco tempo.
Não espere encontrar um ser sorridente
e arrumado ao tocar a campainha. Contente-se com meu pijama de mendigo, meus
cabelos engruvinhados em volta de algum elástico velho, meias largas e cara feia.
Odeio som de campainha. Acho uma
imensa invasão. O fulano aparece quando dá na veneta, toca aquela merda até que
ela se torne uma maneira de coerção e me faça, finalmente, assumir que estou em
casa. E o meu direito de
simplesmente não querer interagir? E a minha
vontade de permanecer entregue às entranhas do meu mundo? Vão para a casa do chapéu,
não é mesmo? O importante é estar sempre bem, sempre dizer o que quer ser
escutado e absorvido, estar sempre disposta e sorridente, ser uma excepcional
anfitriã!
Em suma, não venha à minha casa
se não for convidado. Vou bater a porta na tua cara.
Não queira os meus girassois a
menos que eu lhe ofereça. Eles são meus!
Não espere que eu siga as regras
universais, que cumpra prazos e horários. Não vou abaixar a música às 22h
porque meu tempo é diferente do teu.
Não idealize uma pessoa sensata
caso me veja sentada na janela olhando para cima e cantarolando alguma canção
sentimental.
Não me queira como inquilina se
não pretende ser um proprietário com imensa capacidade de compreensão,
delicadeza, cuidado, carinho e acima de tudo, respeito.
Parabéns!!!!!
ResponderExcluirLindo o blog.
Sil.
Ohhh, obrigada, Silzinha! <3
ExcluirVenha sempre! rs
Lindo. Amei.
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