Chove lá fora. Sentada no
sofá da sala, posso observar as plantas mais frágeis balançando com a força com
que os pingos de água caem do céu. Os vidros estão ligeiramente embaçados, com
algumas gotas escorrendo e formando linhas sinuosas e disformes – como a
melancolia que escorre por minhas veias em dias como hoje - até desaparecerem. Ao meu lado, uma caneca
cheia de café forte, quente e sem açúcar. Do outro lado, minha cadela dormindo
e esfregando na minha cara toda a ausência de preocupações de sua vida canina.
O céu é
branco como o infinito; não tem começo, meio, fim, perspectiva, nem sombra.
Talvez tenha luz. Talvez.
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Na vida real não é possível
aplicar filtros às cenas que nos desagradam, não tem aquela barrinha mágica do
Instagram, cheia de filtros para todos os tipos de humor e estados de espírito.
É preciso encarar a realidade tal qual se apresenta, olhar no espelho e
enxergar os espinhos escondidos que arranham a alma. A vida não nos permite, como
o aplicativo, poetizar imediatamente as angústias e incômodos.
Cenas da
infância, amores distantes, impossibilidades convenientes, possibilidades
incômodas, memórias desfocadas, sentimentos emaranhados, cheiro de chuva. Vento
frio. Tempo vil.
Acendo um
cigarro após três tentativas de fazer com que o isqueiro funcione. Solto a
fumaça devagar, tentando enxergar algum tipo de padrão em sua forma, assim como
tento compreender a caixinha de sentimentos que é aberta sempre que o céu está
nublado e chuvoso. Talvez a chuva seja análoga às lágrimas que não escoam de
dentro de mim quando me vejo deprimida diante de um dia cinzento.
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